quarta-feira, 29 de abril de 2009

DISCURSO DE IVAN SEIXAS NA REINAUGURAÇÂO DO MEMORIAL DA RESISTÊNCIA.

Este Memorial destaca o papel da Resistência na defesa dos valores democráticos. Por isso foi reformado e devolvido ao povo brasileiro. Só quem tem sensibilidade política e histórica pode dar ouvidos ao reclamo das pessoas que por aqui passaram. Esta reforma resgatou o importante documento histórico que é este prédio.
Podemos bradar bem alto que nosso esforço de reconstruir a história é vitorioso, como vitoriosas são as pessoas que lutaram por Democracia e Liberdade. Outra vez vencemos. Mais uma vez as forças da escuridão, que tentaram apagar as pistas dos crimes cometidos contra o povo brasileiro, foram derrotadas. A abertura deste monumento histórico mostra isso.
É sempre bom lembrar que desde o primeiro momento, quando as luzes se apagaram, as vozes da resistência começaram a gritar contra a ditadura mais sanguinária que o país conheceu. Alguns foram gritos de indignação, outros foram gritos organizados. Nunca foram calados. Mesmo quando alguns foram transformados em gritos de torturados, ainda assim denunciavam a ditadura e lutavam por Justiça, Liberdade e Democracia.
Há quarenta anos atrás, neste mesmo dia 24 de janeiro, a ditadura foi desmascarada por um militar. Neste dia, o Capitão Carlos Lamarca denunciou a ilegalidade do regime de terror e os crimes de seus colegas de farda e se juntou à luta das Organizações revolucionárias clandestinas. Os golpistas e torturadores nunca o perdoaram por esse ato, do mesmo modo que nunca perdoaram o ex-deputado Rubens Paiva que denunciou o IPES como um antro de golpistas, que havia criado um serviço secreto particular para perseguir as pessoas fiéis à Democracia e contrárias ao golpe. Ambos foram perseguidos e assassinados pelos carrascos da ditadura em 1971.
A atitude de resgatar este velho prédio e transformá-lo num símbolo de resistência é a manifestação de quem luta pela Democracia e não quer esconder nossa história. E nem apagar as pistas de sangue deixadas por carrascos impunes até os dias de hoje.
Não há como negar que o Memorial da Resistência é mérito das lutas insistentes do Fórum dos ex-Presos e Perseguidos Políticos e das várias entidades, que rejeitaram o estranho Memorial da Liberdade e defenderam o conceito de Memorial da Resistência. Mais lógico e mais sensato.
Por justiça, fazemos questão de salientar que o atual Governo do Estado mostrou seu compromisso democrático e a determinação de revelar esse prédio como centro de torturas e assassinatos, sem esconder a verdade e sem mascarar a realidade. Nisso o secretário João Sayad e o diretor da Pinacoteca, Marcelo Araújo, tiveram papel decisivo e fundamental. E o governador José Serra garantiu que tudo acontecesse.
Para cumprir seu papel histórico e didático, no entanto, o Memorial da Resistência deve ter um destino militante. Projetos e programações a devem sensibilizar a sociedade sobre a importância da luta pela Anistia, a Justiça de Transição e os Direitos Humanos para a Democracia. Para nós do Fórum dos ex-Presos e Perseguidos Políticos, o objetivo maior é completar a transição democrática, consolidar e aprofundar a Democracia.
Devemos usar os danos causados pela ditadura como instrumentos para fortalecer nossas instituições. Que eles ajudem o Estado Brasileiro a ter vontade política e ações na defesa do direito à Memória, Verdade, Justiça e Reparação. E que sirvam de base para a construção de uma verdadeira Democracia, que garanta os direitos fundamentais e uma vida digna ao povo de nosso país.
No ano de 2008 houve a união de entidades, personalidades e autoridades na luta comum pelos Direitos Humanos em defesa da Democracia. Fizemos nossa parte ao criar uma articulação nacional das entidades dos atingidos, em defesa da transição completa para a democracia. A CBA-Brasil, Coordenação Brasileira pela Anistia, reúne entidades dos atingidos e de defesa dos direitos humanos de todo o país, com a preocupação de participar do grande debate que se trava sobre os Direitos Humanos. Queremos também fazer frente à investida da direita mais retrógrada de nosso país, que não dorme e não se cansa de procurar as trevas como cenário para seus atos. Mais que isso, apoiamos as iniciativas em defesa do povo e da democracia.
Vemos com preocupação o presidente do Supremo Tribunal Federal se transformar no porta-voz das forças do atraso e da defesa dos torturadores dos tempos da ditadura. Por outro lado, aplaudimos a ação dos Procuradores Federais Marlon Weichert e Eugênia Fávero na luta incansável pela responsabilização dos torturadores.
Do mesmo modo, apoiamos os ministros Paulo Vannuchi e Tarso Genro que iniciaram o debate sobre a punição aos torturadores. Este último deu ainda uma demonstração de grandeza e soberania nacional ao dar asilo político a um militante de esquerda ameaçado de retaliação pelos neofascistas italianos.
O ano de 2009 é rico em simbolismos para a recuperação de nossa História. Em agosto, comemoraremos os 30 anos da Lei de Anistia, que não foi ampla, geral e irrestrita como queríamos e o país necessitava, mas foi uma importante derrota do regime de terror, que teve de ceder os anéis para não perder os dedos. Temos muito o que comemorar nessa data.
No entanto, lembraremos os 45 anos do golpe de 64 contra a democracia e os quarenta anos da criação da famigerada e infame Operação Bandeirante. Lembraremos que há quarenta anos João Cândido, o Almirante negro, morria na miséria e a ditadura assassinava Carlos Marighella. E que a repressão política executou o operário Santo Dias da Silva há 30 anos. Nunca esqueceremos disso.
Nosso compromisso de não esquecer e cobrar punição para os torturadores dos tempos da ditadura tem um motivo muito claro. A impunidade desses agentes do Estado é um incentivo a prática de torturas e assassinatos pelos agentes atuais. A tortura em órgãos policiais e instituições militares, o assassinato e a violência contra pessoas pobres, principalmente jovens, são uma triste realidade da atualidade.
A sociedade brasileira, as instituições democráticas e o Estado brasileiro, precisam sinalizar com clareza que não aceitam esses crimes de lesa-humanidade, apurando a Verdade histórica, única garantia da consolidação da Democracia e de construção de um futuro melhor.
Temos como tarefa a realização, neste ano, de nosso Congresso Nacional dos Atingidos para que os perseguidos falem por suas próprias vozes. Será um encontro para mostrar todos os crimes da ditadura, os traumas, as seqüelas sociais e denunciar as práticas autoritárias que perduram até hoje.
Acreditamos que o governo estadual e o governo federal se juntarão para dar apoio e suporte a essa nossa iniciativa, pois esse assunto está acima de disputas partidárias. A ditadura atingiu a todos nós brasileiros e democratas. A transição democrática incompleta exige o esforço de todos comprometidos com a Democracia e os Direitos Humanos. Não há partidos nessa luta. Não há argumento ou desculpa para quem se coloca contra ou sabota essa luta.
Nunca é demais lembrar que acreditamos na democracia e no futuro de nosso país. E nossa aposta é na juventude. Ela, que foi muito maltratada pela ditadura, que perdeu sua liberdade de participação, organização e manifestação, ainda é maltratada hoje. O flagelo das drogas, a violência contra crianças e jovens, a despolitização da vida brasileira, o ensino precário e alienante completam o serviço iniciado pela ditadura anti-nacional e anti-povo.
O compromisso dos atuais governos e governantes com o projeto democrático deve ser o resgate da força da juventude e o incentivo do pleno direito de organização, participação e manifestação dos jovens. Tanto o governador José Serra, que teve sua vida estudantil interrompida pelo golpe de Estado, quanto o governo federal, repleto de ex-militantes contra a ditadura, tem condições e o dever de incentivar a participação e a transformação da juventude de hoje em adultos defensores da cidadania.
O Fórum faz sua parte. Em 2008, realizamos várias palestras e visitas guiadas pelas celas e corredores deste prédio, com estudantes de todos os níveis. Em todas essas ocasiões, incentivamos a reflexão sobre os fatos e a conclusão de que é possível a construção de um mundo melhor. Queremos fazer dessa experiência um sucesso e uma referência nacional, com a participação de mais adolescentes, jovens secundaristas e universitários, da capital e do interior do estado.
Convidamos as autoridades do Estado e da União a formarmos uma frente em defesa de uma juventude lúcida, consciente e pronta para o exercício da cidadania. Precisamos que as duas esferas de governo deixem claro seu apoio e participem de nosso Projeto para os jovens no Memorial da Resistência. Para que muitas outras palestras, debates e atos em defesa da vida aconteçam neste espaço ora inaugurado.
Queremos também o apoio e suporte de todos os presentes e de todas as esferas de governo para a realização de nosso Congresso Nacional dos Atingidos pela ditadura.
Por último, queremos expressar nosso agradecimento ao pessoal que se empenhou na realização e execução das obras de reforma desse espaço, criando um centro de referência sem igual no país. Nossas amigas professoras Maria Luiza Tucci Carneiro e Cristina Bruno, a museóloga Katia Filipini, a historiadora Caroline Grassi, os muitos operários dedicados ao projeto e o diretor da Pinacoteca, Marcelo Araújo, que acompanhou todos os passos da reforma de perto e pessoalmente.
Nós, lutadores da liberdade, temos um compromisso com a História, um compromisso que não se finda. Nossa preocupação com os pobres de nossa terra, com a soberania nacional e com nossa juventude nos fez enfrentar o dissabor de voltar a este espaço, onde sofremos torturas de toda ordem, para cumprirmos nossa obrigação com o país, com a história e com o futuro. Estamos todos de parabéns. Cumprimos nossa tarefa revolucionária e nosso papel solidário.
Para que nunca mais aconteçam as ditaduras e que o futuro seja melhor para nosso sofrido povo.
PELO FIM DAS TORTURAS!
DITADURA NUNCA MAIS!
VIVA A DEMOCRACIA!

DEFESA DE SILVIO MARQUES JUNIOR

A GAZETA de 09 de Março de 1964

VIBRANTE A CONCENTRAÇÃO DA FAC

PARTE DE BAURU NOVO BRADO DE ALERTA CONTRA O COMUNISMO

Bauru, 21 de Abril de 1964

EXMO. SR.
MARECHAL HUMBERTO DE ALENCAR CASTELO BRANCO
DD. PRESIDENTE DA REPÚBLICA
PALÁCIO DA ALVORADA
BRASÍLIA
DISTRITO FEDERAL

Senhor Presidente:

Na oportunidade das comemorações do 1º Aniversário da Revolução de 31 de MARÇO, movimento vitorioso que impediu fosse o Brasil transformado em mais um satélite do comunismo internacional, a FRENTE ANTICOMUNISTA, mais conhecida como “FAC”, deseja cumprimentar V. Excia. e formular os melhores votos felicidades.
A “FAC”, senhor presidente, é uma organização sem coloração político partidária, religiosa ou racial e que por ocasião do movimento revolucionário contava com 23 mil homens prontos para lutar em defesa da democracia. Não era pequeno também o número de legionárias, não menos dispostas a luta em defesa do regime de liberdade, único compatível com a dignidade humana.
Hoje, embora confiantes na honradez, patriotismo e dicernimento de V. Excia., por julgarmos que ainda há serio perigo a ameaçar o Brasil, continuamos em atividades e desenvolvemos uma campanha para elevar nossos efetivos a cem mil legionários. Todos os nossos legionários, entretanto, estão prontos para colaborarem com V. Excia., em tudo quanto diga respeito ao aprimoramento, defesa e progresso do regime democrático no Brasil.
Pedimos vênia, nesta oportunidade, para a titulo de colaboração desinteressada e sincera, tendo-se em vista as dificuldades econômicas do momento, apresentar a sujestão de que seja executada uma campanha de esclarecimento popular não só para mostrar ao povo a superioridade do regime democratico sobre o regime comunista, mas também para demonstrar que os sacrifícios que o Governo honrado de V. Excia., hoje exige dos brasileiros serão compensados em um futuro próximo.
Nessa campanha que sugerimos, podemos colaborar, o que ficará na dependência de futuros entendimentos, no caso de vermos acolhido nosso ponto de vista.
Reiterando nossos votos de felicidades, pedindo ao bom DEUS que ilumine e ampare V. Excia., assim como a todos os que sinceramente colaboram com o governo de V. Excia, apresentamos nossas

Saudações Democráticas

Silvio Marques Junior
Presidente Nacional.



Processo nº 5247/66

SENHOR PROCURADOR:


Em obediência ao r. despacho de V. Excia., que houve por bem determinar que eu fosse ouvido e, antes de arquivar-se o processo, oferecesse detalhada explanação sobre os fatos que tratam os autos, passo a exposição.
Em primeiro lugar, farei uma rápida explanação do que vem a ser a “FAC”, tantas vezes referida nos depoimentos inclusos.
Em 1962, quando na Faculdade de Direito de Bauru, onde leciono, assisti os comunistas tomarem contam do então Centro Acadêmico “9 de Julho”, usando para isso, de seus métodos prediletos: a falsidade, a ameaça e a desonestidade. Verifiquei então que tinha o dever de como brasileiro e cristão, mais uma vez, fazer algo em defesa do Brasil e do regime democratico.
Resolvi, assim, fundar a “FAC”, FRENTE ANTICOMUNISTA, que teve seu berço neste estabelecimento de ensino superior e se destinava, de início, a lutar contra os comunistas ali existentes. A luta foi iniciada através de uma campanha em que escrevia eu diariamente pelos jornais e realizava conferencias.
Em 24 de Agôsto de 1963, porém, fazia a primeira reunião pública com um grupo inicial de colaboradores. Essa reunião foi levada a efeito no Colégio Guedes de Azevedo, de Bauru. Fundada estava, então a primeira Legião da FAC, e ficou decidido que na medida do possível iria eu atender os inúmeros convites que me chegavam e iria instalando outras legiões da FAC, uma em cada município.
Não tínhamos como não temos outra aspiração senão a de defender o Brasil, assim como não tínhamos e não temos nenhuma coloração política, religiosa ou racial.
Nossas campanhas eram inicialmente unicamente contra os comunistas, mas posteriormente foram dirigidas contra os corruptos, uma vez que achamos que a corrupção é como um adubo onde viceja o comunismo.
Para melhor atingirmos nossos objetivos, uma vez que a ameaça comunista era cada vez mais séria e já vislumbrávamos a aproximação do momento decisivo, quando a democracia deveria ser defendida de armas na mão, aderimos ao grupo de homens honestos e idealistas que planejavam um movimento de salvação. Passou, a “FAC”, assim, a fazer parte dos grupos que unidos (militares e civis) sob uma só chefia ou comando, preparavam a Revolução de 31 de Março de 1964.
Desde o início a “FAC” e eu próprio, como seu fundador e presidente nacional, fomos atacados rijamente não só pelos comunistas, mas também pelos corruptos e entre os comunistas que nos atacavam estavam os chamados “encapuçados”, os denominados “católicos-progressistas” , “católicos-nacionalistas”, os “nacionalistas”, os “intelectuais”, etc.
Em reportagem publicada n’ “A GAZETA” de São Paulo, em dezembro de 1963, denunciamos a ação dos comunistas, entre os quais alguns elementos do próprio clero, não escondendo nossa firme e inabalável disposição de defender o Brasil, mais uma vez, de armas na mão se preciso fosse.
Por ocasião da Revolução, as varias Legiões da “FAC” já contavam com aproximadamente 23 mil homens e estavam sob o meu comando, obedecendo eu as ordens do Professor Coronel REINALDO SALDANHA DA GAMA, comandante das forças civis revolucionárias existentes no Estado.
As ordens do Coronel Saldanha da Gama era para cooperarmos com a Polícia Civil e com as forças militares em geral, o que foi feito.Os legionários, sem medir sacrifícios, deram novamente, nessa oportunidade, provas comoventes de coragem e civismo.
Algumas diligências foram realizadas para a procura e possível detenção dos comunistas, visando-se assim, impedir qualquer tentativa de reação ou de movimento anti-revolucionário.
Entre as diligências realizadas estão as levadas a efeito em Arealva, município próximo a Bauru e onde havia noticias de que alguns comunistas ativos e perigosos, entre os quais o Bel. Joaquim Mendonça Sobrinho, Edson Bastos Gasparini, José Ivan Gibin de Matos e o Bel. Análio Gilberto Smith, se encontravam.
Os informes esclareciam que esses comunistas estavam escondidos pelo então sub-delegado em exercício naquela cidade, o influente membro do PSP, Adelino Mendonça, progenitor de Joaquim Mendonça.
Por determinação do então delegado regional de polícia de Bauru, Bel. Anor Scatimburgo e sob a chefia do Tenente Ventrice foram realizadas duas diligencias a essa cidade, o que iremos relatar mais adiante.
Na cidade de Promissão, onde era Juiz de Direito o Dr. FRANCISCO ANTONIO GOMES NETO, os legionários da “FAC” igualmente agiram, cooperando com o Dr. Benedito Mendes Filho, na época delegado de polícia daquela localidade, sendo detidas algumas pessoas e exercendo vigilância em outras, inclusive no Dr. Gomes Neto.
A ação democrática e legitima dos legionários acarretou sobre todos os seus elementos e sobre o presidente da “FAC” o ódio do juiz comunista.
Iremos agora informar quem é o denunciante, o atual juiz de direito de Dracena, Dr. FRANCISCO ANTONIO GOMES NETO.
Que S. Excia. O Dr. GOMES NETO é comunista ativista, não há nenhuma duvida, pois até o “S.N.I.” ( Serviço Nacional de Informações), através do oficio 164/65, assinado pelo ex-chefe da agência de São Paulo, Exmo. Sr. General Agostinho Teixeira Cortez, se deu ao trabalho de fazer essa comunicação a direção da Faculdade de Direito de Bauru, alertando-a para as cautelas necessárias.
Ainda hoje S. Excia. Reside em Bauru, a rua Joaquim da Silva Martha, nº 11-44, embora tenha exercido a judicatura na comarca de Pederneiras e agora esteja em Dracena.
Gomes Neto antes de vir para o Estado de São Paulo foi juiz de direito em Camanducaia, Estado de Minas Gerais, seu Estado natal. Vejamos o que fez ali.
Na cidade e comarca de Camanducaia, Gomes Neto se candidatou ao cargo de prefeito municipal, procedendo ao registro de sua candidatura e desenvolvendo a campanha política sem, entretanto, se afastar do cargo de juiz de direito, onde permaneceu até o final de sua campanha eleitoral. Embora gastando muito, Gomes Neto não conseguiu iludir ou intimidar o eleitorado, sendo fragorosamente derrotado.
Logo depois,. Frustrado em seus desígnios imediatos, segundo dizem, foi Gomes Neto chamado a Belo Horizonte e aconselhado ( para evitar processo) pelo Tribunal de Justiça a se demitir do cargo, para o qual demonstrara sua incompatibilidade. Veio a seguir para São Paulo onde ingressou na magistratura Paulista. Não nos foi possível apurar a procedência da considerável importância em dinheiro gasta na inglória campanha eleitoral.
Gomes Neto gosta de escrever. Várias obras já publicou, umas editadas pela “FULGOR”, outras pela “KONFINO” e uma pela “SARAIVA”.
Nesta ultima, entitulada “ Leis de Organização Judiciária” alinhava grave acusação contra o E. Tribunal de Justiça do Estado.
Entre seus trabalhos, entretanto, merece mensão especial o entitulado : DA LUTA PELA AUTO DETERMINAÇÂO”, da Editora Fulgor e prefaciado pelo duplamente colega do autor, Dr. OSNY DUARTE PEREIRA, comunista atingido pelo Ato Institucional nº 1, por pratica de atividades subversivas. Em fls 11, 3º parágrafo desse livro encontramos:

“Somos companheiros da mesma luta e pois, duplamente colegas.”

São eles próprios que o confessam.

Em fls 15, Gomes Neto confessa que o livro nada mais é do que a coletânea de vários trabalhos por ele publicados. Vejamos o que diz em alguns deles, para que se tenha nitidamente um retrato de meu acusador.
Em fls. 66 e seguintes, tratando do caso de espionagem a favor da União Soviética, pelo casal Rosemberg, diz que a punição aplicada depois do processo foi um assassinato. Em fls. 101 fala do então rompimento de nossas relações diplomáticas com a União Soviética, afirmando que tal foi “obra de um governo de mentecaptos e de múmias, de homens de queixo comprido e de inteligência curta”. Em fls. 102 fala ainda que o Brasil ficou privado do intercambio cultural com dois dos maiores países do mundo: a União Soviética e a China Comunista... Em fls 111, falando do líder comunista cubano, Fidel Castro, compara-o a Bolívar, dizendo que o barbudo traidor “serve de novo exemplo as nações latino-americanas”. Em fls. 112 e 113 externa a esperança de ver o regime cubano implantado em toda a América latina.
Muitas outras cousas poderiam ser mencionadas. Achamos, entretanto,que tendo trazido a palavra de meu próprio acusador, palavra essa que ousou divulgar em jornais e no livro antes referido, palavra essa que servia a subversão em marcha, podemos ter como exuberantemente provado ser ele um inimigo do Brasil e da liberdade, como, aliás, já o afirmara a direção da Faculdade de Direito de Bauru, o Gen. Agostinho Teixeira Cortez.
Pedimos vênia, entretanto, para citar alguns outros elementos para mostrar como é perigoso e falso esse comunista.
Em sindicância feita pela polícia de Bauru ficou positivado que Gomes Neto mantinha estreitas e intimas relações com estudantes comunistas ou “companheiros de viagem”, entre os quais o atual advogado em São Bernardo, Dr. Wilson Montagna, Roque Zerbine, Edson Bastos Gasparini, José Ivan Gibin de Matos, Afro César Medeiros, Eduardo Miguel Zogheib, Dr. Joaquim Mendonça Sobrinho, Dr. Oswaldo Pena e mesmo com o então desembargador Edgard de Moura Bitencourt que perdeu seus direitos civis e políticos pelo Ato nº 1.
Em uma sindicância realizada pela Polícia de Penapolis, em 15 de Abril de 1964, Azis Salim Sayeg, depondo, informa que em um congresso que reuniu comunistas daquela cidade da noroeste compareceu o então juiz de direito de Promissão, que não era outro senão Gomes Neto.
S. Excia., por ser quem é, não tem medido esforços para prejudicar todos os que lutam ou lutaram contra a democracia.
Em novembro de 1965 fez uma interpelação judicial descabida e inepta contra o Bel. Benedito Mendes Filho, ex-delegado de Promissão, visando intimida-lo. O D.F.S.P., a Aeronáutica e o Exercito foram informados, sendo que o D.F.S.P e o Exercito se fizeram representar no dia da audiência, impedindo que Gomes Neto concretizasse seus nefandos planos.
Ultimamente, depois de uma série de artigos veladamente ofensivos com que pretende atingir-me, fez S. Excia., a representação que dá origem ao presente esclarecimento.
Para não nos alongarmos mais, em relação ao que consta do presente processo, cumpre ainda dizer que realmente, por duas vezes, fui até Arealva, tomando parte de uma caravana policial chefiada pelo Tenente Ventrice. A Delegacia Regional de Polícia local é quem determinava as diligencias e estabelecia quem iria chefiando.Os legionários da “FAC”, conforme ordens superiores, cooperando com a polícia, muitas vezes, como nessas duas diligencias, faziam parte da caravana.
Muitos dos depoimentos colhidos e juntado aos autos por certidão contem mentiras perfeitamente explicáveis. Sabendo-se que quem presidia a audiência era Gomes Neto, fácil será entender a situação de constrangimento daqueles que ali iam depor. Aliás, verifica-se pelo exame dos depoimentos que a preocupação não era esclarecer o crime imputado aos “amigos” de Gomes Neto, mas sim o de fazer constar (sem qualquer repergunta do promotor) cousas que, no “pensamento” de S. Excia., pudesse dar origem a uma situação prejudicial ao presidente da “FAC”, para aquele que colaborou modestamente para que os ideais dos êmulos de Fidel aqui não vingassem.
Adelino Mendonça, que embora não tenhamos meios documentais de prova, foi um dos fundadores do P.C. em Arealva, é pai do comunista-ativista Bel. Joaquim Mendonça Sobrinho que foi advogado do “líder camponês” Jofre Correa Neto, condenado pela Justiça de Pirajuí por ter promovido com o auxílio de Ivan de Mattos, a invasão de uma fazenda, etc. Adelino, assim, procura defender os “interesses” escusos do amigo e camarada e se vingar, da ação anticomunista por nós exercida, mentindo. Nunca fiz qualquer refeição em sua casa.
Sebastião Garcia era chefe do destacamento policial de Arealva e, segundo sabemos mas não podemos provar, devia grandes favores a Adelino, poderoso chefe político que estava sempre na chefia de polícia de Arealva.
O escrivão de polícia era Paulo de Tal, genro de Adelino, razão pela qual as atividades dos comunistas naquela cidade ficavam em “família”.
Podemos afirmar que embora a residência de Adelino tenha sido revistada, pois ali ficou escondido o comunista Análio Gilberto Smith ( hoje advogado em São Paulo), tudo o mais são inverdades próprias daqueles que procuram enlamear os defensores da democracia, ignorando que jamais conseguirão nos afastar do cumprimento do dever.
O objetivo de Gomes Neto e seus “camaradas” é de aborrecer e desanimar, desencorajar ou intimidar os legionários da “FAC” para que no futuro tenham caminho mais livre para a subversão.
Confiamos, entretanto, que enquanto tivermos na chefia da Instituição do Ministério Publico de São Paulo e pudermos contar com promotores dignos, cultos e honrados, como o signatário do parecer de fls. , nada conseguirão por esse caminho.
Pedindo escusas por haver me alongado na exposição dos fatos, peço a V. Excia., que receba as mesmas como a expressão da verdade.


São Paulo, 12 de Janeiro de 1967.


Silvio Marques Júnior
Promotor Público.

UMA VÍTIMA DO ARBÍTRIO.

Quando, nos anos em que existia um sindicalismo forte e atuante, lembro-me de sua atuação em defesa de sua classe, lutando, reivindicando, em favor de seus companheiros da extinta Sorocabana. Lembro-me das greves reivindicatórias da época e de sua presença à frente dos movimentos sempre altivos e independentes. No movimento golpista de 1964, em uma autentica prova de medo da liderança operária, prenderam-no juntamente com dezenas de operários e estudantes.
Após sua prisão, um novo choque, com sua demissão e a de mais quarenta e um companheiros dos quadros da ferrovia. Lembro-me de sua revolta contra o governador da época, que em um mesmo ato, chamou de volta ao serviço ferroviários aposentados e demitiu-os.
Você, meu velho pai, perdeu trinta anos de serviços prestados a ferrovia e ao estado, com muito amor. Somente lhe restou uma herança, uma asma agravada posteriormente com o surgimento de outras complicações, decorrentes principalmente das noites frias que passou na prisão ( ou faculdade, como o Sr. mesmo preferia dizer).
Não chegavam as preocupações com as noticias de falecimentos de companheiros, que junto com você haviam sido demitidos, com medo de que as viúvas pudessem estar em má situação financeira. Não chegavam os aborrecimentos contra as arbitrariedades e a luta pela sobrevivência. Ainda teve que vir Janeiro de 1969 e a nova injustiça cometida, com mais uma prisão. Uma revolta maior surgiu em seu interior. Revolta contra prisões, perseguições, mutilações, demissões.
Seu sentido de solidariedade nunca arrefeceu. Mesmo sabendo que as causas que levaram a sua prisão foram errôneas . Sabia que
se basearam nos antecedentes de um homônimo seu, mas nunca protestou ou brigou sozinho.
Sempre dizia que queria ser reintegrado à ferrovia, juntamente com todos os companheiros e nunca sozinho. Da mesma forma que sempre dizia, de que seus netos é quem iriam vencer a demanda contra o Estado, se o regime arbitrário persistisse.
Entusiasmava-se nos últimos tempos com relação as noticias relativas a ANISTIA, anistia esta que não teve tempo de saborear, curtir em seu jeito típico.
Mas, meu velho, os regimes ditatoriais são sempre assim, só fingem anistiar os mortos. Mas no alto de sua tranqüilidade eu imagino que está no mínimo rindo de seus algozes, enfim os algozes do povo. Como você mesmo dizia:
“Herói não é aquele que vence uma batalha, mas aquele que atirado ao pó da derrota, consegue ter ânimos para continuar lutando!”
E para mim o senhor foi um herói, pois embora perseguido, demitido, encontrou ânimos para continuar lutando.
Meu velho, somente esta última promessa:
No dia em que o povo brasileiro for anistiado, nós festejaremos a agonia de seus algozes.

Publicada em 19/09/78
no “ Diário de Bauru”.
autoria: Antonio Pedroso Júnior.

Nome do Jornal: Voz da Egreja, A

Prontuário: 2355.
Conselho Editorial: Liga Anticlerical Marquez de Pombal.
Perfil Político: anticlerical.
Periodicidade: mensal, com distribuição gratuita.
Processo Gráfico: tipográfico.
Dimensão: Histórico: "A Voz da Egreja" surgiu na cidade interiorana de Bauru (SP), em maio de 1933. Intitulava-se como um órgão de divulgação das atividades da "Liga Anticlerical Marquez de Pombal”, sediada naquela cidade. A primeira edição adiantava a intenção do jornal de manter-se desligado do partidarismo político e propunha o combate pela liberdade de pensamento e de consciência, que, segundo o editorial de capa - “À guisa de apresentação”-, naquele momento, estavam "amordaçadas" pela Igreja Católica e seus “homens de saia preta”. Exemplo recente disso, afirmavam, era a promulgação do decreto presidencial que estabelecia o ensino religioso em todas as escolas do país (1931), tal medida evidenciava o acordo entre Getúlio Vargas e a Igreja Católica, demonstrando, também, o interesse desta última em reassumir seu papel na política nacional. Diante deste contexto, o jornal propunha-se a combater o clericalismo, isto é, a ingerência da Igreja Católica na política varguista. Proclamando-se como nascido da luta e para a luta, "A Voz da Egreja" pretendia dar prosseguimento ao seu programa, frente a todas as intempéries, pelo apoio e boa vontade de todos os livre-pensadores que quisessem “extirpar do organismo brasileiro, esse cancro gangrenoso que se chama clero”. Para ele, a atitude anticlericalista do jornal refletiria a postura de defesa do povo contra uma religião que pretendia fazer-se novamente oficial, escravizando as mentes e restabelecendo os tribunais da Inquisição. Segundo o jornal, o Vaticano era como um governo estrangeiro, mandava padres para o Brasil, seus agentes no país, unicamente para se aproveitar da ignorância do povo e extorquir riquezas para serem enviadas ao estrangeiro, fato que caracterizaria a Igreja Católica como uma organização imperialista a serviço das idéias do “inferno” e do “purgatório” para aplicar as maiores trapaças nas pessoas. Esta é a justificativa do combate a ser impingido ao “formidável sindicato de exploradores e de espiões” formado por padres. O jornal conclama seus leitores a cerrarem fileiras e se utilizarem de todos os meios lícitos para expulsar os padres do Brasil seguindo o exemplo das nações civilizadas. Aqui, em uma clara alusão ao protestantismo majoritário nos Estados Unidos da América, o jornal alega que com a presença dos “eunucos do Papa” no Brasil, o país nada havia lucrado, mantendo-se estagnado. O jornal propunha, ainda, que após a expulsão da Igreja Católica do Brasil, fossem nacionalizados os seus bens, além de investigados todos os governantes brasileiros que de alguma maneira tivessem colaborado com aquela instituição religiosa. O jornal esperava dos leitores o acolhimento de suas proposições e avisava que, se a campanha tivesse sucesso, a tiragem de "A Voz da Egreja" aumentaria de 3.000 para 10.000 exemplares. O fato de o jornal ter publicado na terceira página do número inaugural um informe do Partido Socialista Brasileiro também não deve ser desprezado. Neste texto, o PSB conclama o povo de Bauru a lutar pelos direitos das classes trabalhadoras durante o processo eleitoral de 1933. Afirmava que era chegado o momento para aqueles que realmente produziam e realizavam no país os “milagres do progresso e a vertigem da civilização”. Estes teriam seus direitos representados em uma organização partidária que defendesse intransigentemente as reivindicações sociais. Com palavras de ordem, o comunicado do PSB de Bauru termina com o slogan: “Avante, Companheiros: ‘Por São Paulo forte no Brasil Unido!’”.
Número de Páginas: 4.
Local/Edição: Bauru (SP).
Prontuariado: Carlos Gewe
Razão da Apreensão: O jornal anticlericalista "A Voz da Egreja" era impresso nas oficinas de "A Tribuna Operária", cujo diretor-gerente era o tipógrafo alemão Carlos Gewe, considerado como um dos membros mais atuantes do Partido Comunista na região de Bauru (SP). O exemplar foi apreendido, segundo a polícia, em razão de um descuido de seus editores, que não legalizaram a publicação junto às autoridades. Há, no entanto, dois outros motivos que poderiam ter levado ao confisco do jornal: consta do prontuário de Carlos Gewe uma carta de Ary Nascimento Cordeiro, secretário da Liga Católica “Jesus, Maria, José”, na qual o autor queixa-se às autoridades de que o jornal anticlericalista feria a dignidade dos católicos de Bauru, pedindo a atenção dos poderes competentes.

JORNAL TRIBUNA OPERÁRIA

Nome do Jornal: Tribuna Operária
Prontuário: 2355.
Conselho Editorial: Carlos Gewe (diretor)
Perfil Político: Socialista; Anticlerical.
Periodicidade: Quinzenal.
Processo Gráfico: Tipografia.
Dimensão: Histórico: A "Tribuna Operária", jornal da cidade de Bauru (SP), declarava-se defensor do proletariado brasileiro e de pequenos agricultores. Ao publicar artigos em defesa dos direitos dos trabalhadores, traçava comentários críticos sobre a legislação trabalhista àquele momento proposta pelo governo Getúlio Vargas. Defendia o socialismo, sustentando como bandeira de luta “acabar com a exploração do trabalho para o lucro dos patrões”. O jornal tinha como lema a trilogia: liberdade, igualdade e fraternidade, e “Avante! Avante! Oh! Brasileiros. O Socialismo em pé!” Era comum a reprodução de textos cedidos por outros periódicos, como no caso deste exemplar confiscado em março de 1933. O foco central da matéria publicada pelo Jornal Baptista, ligado à igreja homônima, discute a moralidade pregada pelos católicos a partir do caso de um padre do interior de São Paulo, que havia engravidado uma de suas empregadas. Este, apesar de ter violado o voto do celibato clerical, continuava ministrando normalmente os sacramentos. O jornal, que contava com a colaboração de José Rodrigues Teixeira e do “Conselheiro Ambrósio”, editava um suplemento semanal com ilustrações. Assinam artigos nesta mesma edição, também a Liga Anticlerical de Pelotas e a Liga Operária de Araçatuba. O exemplar apreendido apresenta um único anúncio de patrocinador: o mata-formigas da marca "Tatú”, sob o slogan,“a melhor marca de formicida”. Com destaque na primeira página, a embalagem do produto apresenta o desenho de uma caveira, em alusão ao seu conteúdo “venenoso”.
Número de Páginas: 4.
Local/Edição: Bauru (SP)/ 26 de março de 1933.Prontuariado: Carlos GeweRemissão: 2355
Razão da Apreensão: Constam do prontuário de Carlos Gewe, diretor-gerente da "Tribuna Operária", quatro exemplares do referido jornal, além de outras publicações produzidas na mesma oficina de impressão, tais como os jornais "Argus", "A Luta" e "A Voz da Egreja". Considerado pela polícia como o membro mais atuante do Partido Comunista na região de Bauru, o alemão Carlos Gewe acumulava estigmas; além de ser estrangeiro, havia sido denunciado primeiramente pelo secretário da Liga Católica “Jesus, Maria, José”, Ary Nascimento Cordeiro, que irritado com a publicação do jornal anticlericalista "A Voz da Egreja", denunciou a ligação da oficina do "Tribuna Operária" com publicações comunistas.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

O DELETÉRIO CIDADÃO DE DALLAS.

Sabe-se de fonte segura, que determinado “professor” do primeiro ano, elemento ligado ao que mais de daninho e retrogrado existe, fez denuncias caluniosas contra três dos mais estimados professores, apontando-os como comunistas e subversivos ao Departamento de Ordem Política e Social –DOPS-.
O funcionário facista daquela “especializada” ao chegar em Bauru foi procurar o cidadão de Dallas e este, confirmando a nefanda calúnia, encaminhou-o a Faculdade de Direito de Bauru.
O Diretor, professor Mauricio Leite de Toledo, instado pelo agente sobre as atividades dos professores denunciados, negou-lhe atendimento. Demonstrou nosso diretor ser pessoa digna e correta, amante da verdade, pois não podia informar o que de fato nunca existiu e os professores sempre foram merecedores de sua alta estima e confiança.
O pernicioso elemento, brasileiro por acidente e para vergonha do Brasil, desesperado profissional do anticomunismo a soldo do consulado ianque em São Paulo, não mede conseqüências, a tudo e a todos macula e conspurca, para alcançar seus monstruosos objetivos.
Para melhor exercer suas funções, fundou uma espécie de filho bastardo do IBAD, a Frente Anticomunista, com essa seita e seus “fundos” misteriosos implanta ódio, terror, ignorância entre jovens desavisados, dilui e gangrena as famílias.
Cada qual tem o direito de defender a sua ideologia, mas a ninguém é dado o direito de formar grupos armados para defender o gorilismo. Os bípedes, em sua regra geral, quando racionais, discutem, trocam idéias, apontam fatos, e é daí, que surge a luz e que se manifesta a democracia.
O aspirante a aprendiz de corvo, é inculto, ignorante, incapaz de um dialogo racional e, como apoiado em dois pés, não se sente seguro, deixa-se fotografar apoiado em outro, o fuzil, tornando-se uma figura “sui generis”, não é bípede nem é quadrúpede ( creio que os quadrúpedes não o aceitariam).
Em suas pregações não aponta soluções, pois o fanático bronco, ignorante das mais comezinhas questões. Os professores, injustamente acusados, sendo um deles lúcido jornalista que escreve, no linguajar simples do caboclo sofrido, as verdades mais cruciantes, as opiniões mais abalizadas, desgosta o cidadão de Dallas. O segundo professor, sendo autor de inúmeras obras de alto gabarito, versando com profundidade e conhecimento autentico os mais variados problemas, incomoda o deletério rapinante. O terceiro, docente atualizado de importante cátedra, cujas opiniões objetivas e candentes sobre os problemas internacionais modernos, portador de um raciocínio e cultura que não se deixa levar pelas primeiras impressões, tendo profundidade e não se contentando com a gama de conhecimento, não agrada ao capacho do imperialismo. Este capacho é amante da mentira, dos sofismas já desmantelados no século IV, antes de cristo.
Seu livro, que só é vendido porque obrigatoriamente adotado, não passa de tesoura e goma arábica, e o que escapa da técnica “tesourabica” é digno de piedade e passível de curatela. Os calouros que se precavenham, devem ler e estudar muito para se imunizarem das ignorâncias e do ranço ministrados de cátedra.
Por ser brasileiro que nasceu e que luta por e pelo Brasil, por ser acadêmico desta Faculdade pioneira, por ter tido a felicidade de ser aluno dos três professores calhordamente acusados, com os quais muito aprendi, é que escrevo essas linhas. É necessário que uma voz se levante contra a odienta pratica da discriminação e da intolerância; que se diga de alto e bom som, que este “professor” não é digno do cargo que ocupa, é a serpente peçonhenta a preparar botes traiçoeiros contra seus próprios colegas.
Traição, aliás, é a sua arma predileta.

WILSON MONTAGNA, em artigo publicado no Jornal “O Renovador”, órgão de divulgação do Partido Acadêmico Renovador da Faculdade de Direito de Bauru – ITE -, em março de 1964. A publicação deste artigo rendeu ao seu autor, dois meses de prisão, acusado pelo promotor público Silvio Marques Júnior, alvo de suas criticas, de ser comunista.

A MISÉRIA FERROVIÁRIA CONTRA AS METRALHADORAS DE ÍTALO FERRIGNO.

GREVE DA COMPANHIA PAULISTA DE ESTRADA DE FERRO EM JANEIRO DE 1949.

Dizem os ferroviários mais antigos, que na então Companhia Paulista de Estrada de Ferro eram obrigados a trabalhar de gravata, por ser esta peça do vestuário indispensável ao uniforme do trabalhador, por determinação da direção da empresa.
Entretanto, face ao minguado salário que percebiam, colocavam a gravata sobre camisas velhas e muitas vezes rasgadas, por não mais suportarem cerzimento. Andavam de gravatas por determinação da chefia, mas famélicos, com roupas rasgadas e praticamente descalços.
Já em 03 de Agosto de 1947, os ferroviários iniciaram a luta por melhores salários, que não eram concedidos com a alegação de que estavam congelados por determinação do governo federal.
Salários congelados, mas o custo de vida em constante alta no pós-guerra, comprovando nitidamente de quem paga a conta nas crises mundiais, ocasionadas pelos pseudogovernantes sempre foi a espoliada classe trabalhadora. Revoltavam-se os trabalhadores, por terem que tirar os filhos das escolas, para que estes, em conjunto com suas mães, buscassem ocupação para ajudarem o chefe de família a manterem o lar.
Entretanto, ao contrário de hoje, as mulheres tinham espaço reduzido no mercado de trabalho, e para poderem colaborar no sustento do lar, somente restava a elas o árduo trabalho de lavadeiras e utilizavam-se dos córregos e rios, ainda não poluídos, para o desempenho de suas atividades.
Neste período, o salário médio do ferroviário da Paulista era de CR$ 750,00 (setecentos e cinqüenta cruzeiros) mensais, que eles classificavam como salários de "aprendizes de ferroviários", pleiteando um aumento geral de CR$ 500,00 (quinhentos cruzeiros).
Para termos uma idéia, uma noção dos valores da época, um conferente em início de carreira da então Estrada de Ferro Sorocabana recebia mensalmente o salário de CR$ 1.650,00 (um mil, seiscentos e cinqüenta cruzeiros), mais que o dobro que o salário do colega da Paulista.
Neste período, pós 2ª Guerra Mundial e pós Estado Novo, começaram a campanha pelo “O Petróleo é nosso"; “Movimento contra a Carestia" e pela “Paz Mundial", empenhando-se a militância do proscrito Partido Comunista, em sua organização e divulgação. Sendo certo que em seis de outubro de 1948, realizou-se na cidade, um comício da campanha e em 17 de novembro, era organizada a Comissão Municipal de Defesa do Petróleo, com a presença de ferroviários das três ferrovias aqui existentes, além de pessoas representativas da comunidade, sendo certa as presenças de Antenor Dias, Júlio Xavier, Arcôncio Pereira da Silva, Elias Calixto Bittar, Alberto de Souza, dentre tantos outros que se engajavam nas lutas populares de então.
Entretanto, no caso da luta reivindicatória da Paulista, como esta era particular, a arbitrariedade e a prepotência campeavam, sendo que a cada liderança emergente, imediatamente surgia uma demissão, pois esta era a fórmula mágica encontrada pelos maus patrões e especialmente pelo então inspetor geral da empresa, Sr. Jayme Cintra, para tentar calar a revolta dos trabalhadores, mais sem jamais terem alguma atitude ou gesto que viesse a beneficiar a categoria.
Quando, em 09 de Janeiro de 1949, a imprensa nacional noticiou ameaça de greve na ferrovia Central do Brasil, ocasião em que policiais armados ocuparam aquela ferrovia com a intenção de salvaguardar o seu patrimônio, o todo poderoso inspetor geral determinou que todos os ferroviários que trabalhavam na via permanente da Paulista, debaixo de sol e chuva, também realizassem vigílias noturnas, ao longo da linha, com a finalidade de se evitar qualquer movimento paredista na Paulista.
Há mais de ano, os ferroviários clamavam por aumento salarial e a própria direção da empresa sabia que, a qualquer momento, eclodiria o movimento grevista.
Com a situação de miséria e desespero, em que se encontravam os trabalhadores, colocá-los em plantão extraordinário, sem pagamento de horas extras, “era a mesma coisa que colocar a raposa para tomar conta do galinheiro", entretanto, a grande massa representada pela classe ferroviária, ia com estas determinações absurdas do inspetor, aumentando sua disposição para a luta por melhores salários e conseqüentemente por melhores condições de vida.
Clamavam em seus manifestos, por melhores salários, por um salário digno, que significaria mais pães em suas casas e desta forma, menos lágrimas e tristezas à mesa. Com o salário que percebiam na ferrovia, muitas vezes eram obrigados a morarem em casas de “pau a pique", a fazerem tão somente uma refeição diária, mas iam para o trabalho com a obrigatória e inseparável gravata.
O estômago roncava de fome, com seu barulho confundindo-se com o apito das locomotivas e, todavia, tinham que seguir as ordens do chefe, afinal, a aparência era fundamental.
Desde aquela época, reinava a hipocrisia entre os detentores do poder, tanto do poder político como do econômico.
Aliás, um parêntese se faz necessário, para irmos até o início da década de 60, quando os gráficos bauruenses lutavam para receber, ao menos, o salário mínimo mensalmente, o dono de uma grande empresa gráfica local, que empregava grande número de mulheres, chegou a afirmar taxativamente em uma reunião:

"... mulheres ganham para gastar em pinturas e roupas. Para tal fim não é necessário o salário mínimo..."

Quando lemos ou temos conhecimento destas barbaridades, somos obrigados a concordar com o velho combatente Alberto de Souza:

"Patrão bom já nasce morto!"

Retornando ao movimento reivindicatório de 1949, a pressão do inspetor geral surtiu efeito até o dia 20 de Janeiro, quando pleiteando o já decantado aumento de CR$ 500,00 em seus salários, exatamente às 6 horas e 45 minutos da manhã, os ferroviários de Bauru declararam-se em greve e ocupando toda uma composição férrea, dirigiram-se para a pequena Estação de Triagem, com o apito da locomotiva tocando de forma ininterrupta, como forma de comunicarem a população de que estavam em greve.
Em Triagem, distante 3 quilômetros da Estação Central de Bauru, unem-se aos companheiros daquela estação e de Pederneiras. Inicia-se ali, uma das mais violentas e sangrentas greves ocorridas em nossa cidade.
À luz da história, a violência utilizada de forma exacerbada pela repressão, teve igualmente sua parcela de culpa na Comissão Sindical.
Sim, pois Bauru, Triagem e Pederneiras, paralisaram suas atividades com base em informações ufanistas de que a linha toda cessaria suas atividades, mesmo porque, a luta por melhores salários não estava circunscrita somente à nossa região. Os informes otimistas, trazidos por ferroviários da Comissão Sindical Estadual, estimularam a greve, que os ferroviários e a Comissão local, acreditavam ser geral. O ufanismo torna-se evidente, quando tomamos conhecimento ao longo desta pesquisa, de que quando elementos do comando de greve local buscaram contato com o restante da linha para informar da paralisação na cidade, encontraram reações de surpresa, pois o restante da linha funcionava normalmente.
E o pior, os ferroviários de outras estações desconheciam a existência do movimento e estes informes ufanistas e inverídicos provocaram uma greve parcial de tristes conseqüências para a classe trabalhadora. Não vamos aqui discutir, se o comando local deveria ou não ter recuado com o movimento, no momento em que tomaram conhecimento da não adesão total, mesmo porque estavam com a adrenalina alta, e talvez, ousaram sonhar que se o movimento persistisse por aqui, toda a ferrovia obrigatoriamente seria obrigada a paralisar suas atividades.
Lógico que sonhar é permitido, e devemos sonhar sempre, para termos motivação para o amanhã, entretanto quando o sonho coloca em risco a integridade física de outrem, creio que deva ser contido.
Não foi isto que ocorreu.
Em toda a história brasileira, por diversas vezes iremos encontrar casos e situações, em que informes mentirosos levados por pessoas ufanistas, ou quem sabe mal intencionadas, ocasionaram perdas irreparáveis. Assim o foi no levante de 1935 e igualmente por ocasião da saída do Capitão Lamarca do 4º RI de Quitaúna.
No caso específico da chamada Greve de Triagem, se a linha toda parasse, a Companhia iria, evidentemente, negociar com a categoria como um todo, e não somente buscar desobstruir a pequena parte da linha que encontrava com suas atividades paralisadas, pois isso de nada adiantaria para o reinício de suas atividades.
Com a paralisação apenas parcial, ao invés do diálogo com os grevistas, a direção da empresa buscou a ajuda policial, com o intuito de desocupar de qualquer forma a estação de sua propriedade, pois ao chegarem à Triagem, os grevistas apossaram-se das dependências da Estação e obviamente de seu telégrafo, para poderem se comunicar com o restante da linha, aguardando a adesão total, que não veio a ocorrer, como já vimos anteriormente.
Simultaneamente a isto, começam a organizar piquetes com a finalidade de não deixar passar o trem de passageiro de prefixo P-14, com destino a São Paulo. Esta composição partia de Bauru, às 8h00 sendo que mil e cem ferroviários em ato de desafio deitaram-se sobre os trilhos para impedirem a sua passagem.
Enquanto isto chega a polícia, convocada pela direção da ferrovia, sendo que um destacamento do 4º Batalhão de Caçadores, comandado pelo Tenente Benedito Netto, equipados com metralhadoras, fuzis e bombas de efeito moral, para dispersar o movimento desarmado dos ferroviários.
Sempre foi assim. Contra a fome e a miséria, a fúria repressora. Irmãos agredindo, ferindo e matando irmãos, por ordem de mentes unicamente preocupadas com seu bem estar. O tenente determina que os grevistas em dez minutos, desocupem o leito da ferrovia e a estação, não obtendo sucesso nesta ordem.
Determina então que os soldados arremessem as bombas de efeito moral contra os grevistas, mas igualmente não obteve sucesso, não tendo sido atendido pelos seus comandados, que igualmente aos ferroviários eram oprimidos e estavam com seus salários achatados.
Nova ordem do já histérico comandante.
Nova recusa por parte da tropa.
Tenente Benedito Netto inicia então a operação e é seguido apenas por parte da tropa, sendo que o restante conseguiu ter o discernimento necessário para não cumprir ordens tão absurdas, a de atacar com bombas grevistas desarmados, em busca de uma sobrevivência digna. Por falta de sorte do sanguinário tenente, o vento soprava contra suas forças, e os grevistas protegendo as narinas com lenços começam a arremessar as bombas de volta contra a tropa policial. Sempre a classe trabalhadora desarmada encontrava e encontra saídas criativas nos momentos de confronto contra a repressão.
Irritado, bravo, com a atitude dos grevistas, o tenente determina que a tropa "cale as baionetas".
Com as baionetas caladas e com coronhadas tentam dispersar a massa.
Neste momento, chegam reforços da Força Pública e mais, investigadores e delegados do DOPS, dentre eles os doutores Leopoldo Mendes e Ítalo Ferrigno acompanhando o inspetor geral Jayme Cintra.
Este, ao ouvir dos grevistas que a greve era motivada pela fome e em busca de melhores salários, respondeu com sua arrogância peculiar:

"... que a greve era subversiva e contra o governo!"

A massa trabalhadora em uníssono respondeu que a greve era organizada, fomentada pela miséria em que viviam, ao que o inspetor retira-se irado do local, apenas dizendo aos grevistas de que a polícia tinha carta branca para agir e desocupar o imóvel de suas incomodas presenças. Convém ressaltar de que o inspetor somente foi a Triagem depois de tentar e não conseguir, reunir-se separadamente com as lideranças do movimento.
E, também neste momento, ocorre um grande erro da classe trabalhadora, que se dispersa, sendo que em sua grande maioria, retornam para Bauru e Pederneiras, permanecendo no local apenas setenta bravos ferroviários.
Bravos sim, entretanto desarmados.
Verificando que o número de grevistas reduziu-se para pouco mais de meia centena, o tenente determina, prazeroso, o início daquilo que ficou conhecido como a “Chacina de Triagem".
Dizem os mais antigos que o matraquear das metralhadoras e dos fuzis foi ensurdecedor, e que a linha férrea da Paulista tingiu-se de vermelho, do sangue ferroviário.
Cinqüenta grevistas feridos, sendo cinco em estado grave: Nelson Polastro, Elias Calixto, Walter Martins, Jaime Rainaud, José Moraes e João Camargo.
Desarmados, os grevistas empunham uma grande bandeira nacional e cantam o hino pátrio, na inocente certeza de que a polícia respeitaria os símbolos nacionais.
Quanto mais tremulava o pavilhão e mais alto cantavam o hino nacional, maiores eram os gritos do tenente para seus comandados os reprimirem.
Correndo pela cidade, a notícia da repressão policial em Triagem, seus companheiros e irmãos das oficinas da então Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, liderados pelos jovens sindicalistas e comunistas Antenor Dias e Júlio Xavier, realizam de imediato uma greve de advertência, em solidariedade aos companheiros. Pela realização desta greve e por organizarem um abaixo assinado, solicitando o arquivamento dos processos contra o Cavaleiro da Esperança, Luiz Carlos Prestes, Antenor e Júlio foram, naquele ano de 1949, punidos com uma suspensão de noventa dias e proibidos de freqüentar as dependências da Estrada de Ferro.
Em 22 de Janeiro de 1949, a Comissão Sindical lançou um manifesto ao povo de Bauru, que depois de denunciar a repressão ocorrida, finalizou:

"... estávamos desarmados e lutando por um pedaço de pão para nossos filhinhos e esposas, e por isso mesmo tínhamos a ilusão de que não seríamos massacrados selvagelmente, como fomos, pelos bandoleiros de Dutra.”

“O ensinamento para nós, para os trabalhadores de Bauru e para o povo brasileiro, é de que não há mais nenhuma lei, nenhuma garantia, nenhuma regra de decência humana, nenhum direito que seja respeitado em nossa pátria! E por isso declaramos aos trabalhadores e ao povo de Bauru, que estamos dispostos a defender o nosso direito de não morrer de fome, por todos os meios ao nosso alcance.
Apontamos ao povo de Bauru o nome dos criminosos, que devem ser julgados pela Justiça Popular, implacavelmente: Luiz de Oliveira Lima, Ítalo Ferrigno, Jayme Cintra, João Scheiffer, Torreta, Maia, Gastão da Rocha Leão, José Castro de Pena, Alcides Maurício, Benedito Miranda, Joaquim Duarte (vulgo Periquito), Henrique Ambrósio, Adolpho Véscio, Tenente Benedito Netto, Sargento Leovigildo Pereira de Souza, Cabo Antonio Francisco do Nascimento e os soldados Pedro Garcia Leal, Luiz Paixão da Silva e José da Costa."
Todavia minha amiga, a repressão ao movimento paredista de Triagem não se encerrou em 20 de Janeiro, pois a Companhia Paulista de Estrada de Ferro solicitou da Justiça do Trabalho a apuração das responsabilidades, pela deflagração do movimento grevista e esta, em 10 de Outubro de 1949, julgou favoravelmente para a ferrovia, autorizando-a a demitir os ferroviários: Elias Calixto, Nelson Polastro, João Nascimento e Arcôncio Pereira da Silva, com fundamento e amparo legal, nas letras "b" e "h" do artigo 482 da CLT, que regulamenta incontinência de conduta ou mau procedimento e atos de indisciplina ou insubordinação.
Na área jurídica trabalhista, como se pode ver, fome e baixos salários tinham outra nomenclatura.
Paralelamente ao procedimento na Justiça do Trabalho, tramitava no fórum local outro inquérito, com base na Lei de Segurança Nacional, no qual constavam como réus os membros da Comissão Sindical local e as lideranças que se destacaram no movimento.
Em 14 de Outubro do mesmo ano, o então Juiz de Direito da Comarca de Bauru, Dr. Eugênio Teixeira de Andrade, embora reconhecendo que "a polícia teve necessidade de atirar bombas lacrimogêneas e disparar alguns tiros para o alto", definia como mais perigoso para a sociedade às supostas idéias marxistas dos líderes ferroviários.
Sempre as idéias marxistas eram consideradas como mais perigosas que as armas de fogo.
E em sua sentença, o dr. Eugênio condenou os senhores Nelson Polastro e Elias Calixto à pena de um ano de detenção, e Walter Martins, Oswaldo Nogueira, João Nascimento, Ernesto Fernandes dos Santos, Benedito Martins Borges, Antônio Dias e Arcôncio Pereira da Silva à pena de seis meses de detenção, e todos eles a pagarem multa no valor de CR$ 2.000,00 (dois mil cruzeiros) e mais CR$ 30,00 (trinta cruzeiros) de taxa penitenciária.
Incrível, mas é a verdade.
O salário médio do ferroviário era de CR$ 750,00 (setecentos e cinqüenta cruzeiros). Condenados à prisão, demitidos sem direito pecuniário algum, ainda foram penalizados com multas equivalentes a três meses de salários.
Calixto evadiu-se e ficou longo tempo na clandestinidade, aguardando a prescrição da pena. Conta-se que certo dia, ao sair do local onde se encontrava, ao olhar para a fila do então Cine Ritz na cidade de São Paulo, viu a última pessoa que desejava ver naquele momento, o delegado do DOPS, Dr. Ítalo Ferrigno.
Arcôncio foi preso em Guaimbê e transferido para Bauru, onde cumpriu sua pena na cadeia pública local, sendo que boa parte da prisão cumpriu em companhia do velho combatente, Alberto de Souza, sapateiro, integrante da coluna Prestes e paraplégico em virtude de torturas policiais. O velho Alberto encontrava-se preso por ter disparado alguns tiros no interior da “Casa Sampiere”, em decorrência de desacordo comercial, quando da aquisição de solas de couro para a confecção de calçados, mas isto minha amiga, é uma outra história, que certamente será contada pelo companheiro e irmão Arthur Monteiro Júnior, advogado, jornalista e pesquisador da história de Alberto.

À guisa de curiosidade:
1 - O Dr. Ítalo Ferrigno, apontado como repressor pelos grevistas, 19 anos depois deste episódio, presidiu como delegado do DOPS/SP, o inquérito instaurado contra os estudantes presos no Congresso da UNE, em Ibiúna, no ano de 1968, dentre eles o bauruense Milton Dota;
2 - Arcôncio (91) continua residindo em nossa cidade, Walter Martins (77) na cidade de São Paulo e Elias Calixto Bitar, faleceu aos 23 de Novembro de 2004 em Bauru, aos 85 anos de idade, sem ter seus direitos trabalhistas reconhecidos ;
3 - O perigoso grevista e comunista Benedito Martins Borges, mais tarde ficou conhecido e continuou a ser temido como “Borjão”, pai de santo conhecido, respeitado por todo o estado. Dizem os mais antigos que realizava trabalhos espirituais por encomenda para Pelé e o Santos Futebol Clube.

Muito embora tenha sido uma greve de curta duração, este movimento insere-se na história da classe trabalhadora de nossa cidade pela repressão sofrida e por ter ocorrido durante um governo pretensamente democrático: o de Eurico Gaspar Dutra. Nas páginas a seguir, colocamos uma pequena biografia de Arconcio Pereira da Silva, Armando Ferreira dos Santos e de Elias Calixto Bitar. Dos demais grevistas, por enquanto, não encontramos maiores subsídios e solicitamos a quem conheça seus parentes, amigos que nos enviem material para podermos ampliar o nosso trabalho.

ARCÔNCIO PEREIRA DA SILVA.


"A humanidade precisa de sonhos para suportar a miséria nem que seja por um instante".
Oscar Niemeyer, arquiteto e marxista.

Ferroviário e militante marxista desde o final dos anos 40, é natural de Viçosa, em Alagoas, onde nasceu aos 16/09/1915, filho de Joaquim Pereira do Nascimento e de dona Maria Pereira de Oliveira, sendo que ainda jovem veio para o Estado de São Paulo e em 1936, aos vinte e um anos de idade, adentrou aos quadros da então Companhia Paulista de Estrada de Ferro.
Na prática, foi aprendendo, assimilando, as gritantes diferenças de classe existentes dentro da Estrada de Ferro e sofrendo com a miséria que grassava no seio da classe ferroviária, até que em 1946, recrutado pelo companheiro de trabalho Elias Calixto Bitar adentrou aos quadros do Partido Comunista, então na legalidade, com a intenção principal de estudar os princípios básicos do marxismo e colocá-los em prática na defesa dos direitos da classe trabalhadora, e, posteriormente, com o partido colocado na ilegalidade, participou da organização da Comissão Sindical dos ferroviários da Paulista e da organização da histórica greve de 20 de Janeiro de 1949, sendo que, em conseqüência deste movimento grevista foi demitido da ferrovia e condenado a seis meses de detenção além de multa de CR$ 2.000,00 ( dois mil cruzeiros ), como incurso nas sanções previstas no artigo 201 do Código Penal combinado com as penalidades previstas no Decreto Lei 9070 de 16/03/1946.
Arcôncio foi preso e cumpriu sua pena na Cadeia Pública de Bauru.
Demitido, preso, casado e com filhas para criar, continuava sua militância política e trabalhava naquilo que aparecesse para poder sobreviver. Colheu café, carpiu, colheu laranjas, tendo ao lado sua brava companheira Iraci, que fazia salgados e revendia cera, para completar o orçamento doméstico.
Na década de 50, participou de todas as lutas travadas pelo Partido Comunista e dentre elas:
“Comitê da Aliança Pró Paz e contra a Carestia"
"Cruzada Humanitária pela proibição das armas atômicas"
“Manifestos em Defesa de Luis Carlos Prestes"

Era considerado, desde o movimento paredista de 1949, um dos comunistas mais perigosos de Bauru e região, mesmo assim em 1957, por solicitação direta dos militantes do Partido e interferência do então Deputado Federal Luis Francisco de Carvalho, foi contratado pelo então Governador de São Paulo para trabalhar na extinta Estrada de Ferro Sorocabana, como conferente.
Diz a lenda, que o então governador, Jânio Quadros, ao ser alertado sobre a ideologia política de Arcôncio, perguntou:

-comunista tem família?
-comunista come?

E assinou a contratação de Arcôncio.
Imediatamente este adentrou aos quadros da União dos Ferroviários da Estrada de Ferro Sorocabana, liderando ao lado de Antonio Pedroso, Ramiro Pinto, Jeremias Renato Comin, Homero Penteado e outros, os movimentos reivindicatórios dos ferroviários em Bauru e região.
Com o advento do golpe militar de 1964 foi novamente preso, ficando na Cadeia Pública de Bauru por praticamente dois meses e aos 20 de Setembro do mesmo ano, foi demitido dos quadros da ferrovia por Decreto do então governador Adhemar Pereira de Barros com fundamento legal no Ato Institucional de 09 de Abril de 1964, indo trabalhar na Cooperativa de Consumo dos Ferroviários da Sorocabana, na cidade de Botucatu e posteriormente, com o fechamento desta, foi trabalhar como jornaleiro nos trens da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil e posteriormente adquiriu uma Banca de Jornal e Revistas, na Praça Rui Barbosa, na cidade de Bauru. Em 1970, juntamente com João Batista Dias, Milton Bataiola e Oswaldo Penna foi preso às vésperas das eleições e levado para o Quartel do Exército de Lins.
Na década de 80, foi contratado pelo prefeito bauruense Tuga Angerami para trabalhar na Prefeitura Municipal de Bauru, pois muito embora em 1979, tenha sido anistiado com fundamento na Lei 6683/79, a FEPASA sucedânea da Paulista e Sorocabana, tão-somente veio a aplicar a legislação em 1983, durante o governo de Franco Montoro, ocasião em que foi reintegrado a ferrovia e aposentado, muito embora não tenha sido aplicado em seu caso e de seus companheiros demitidos a legislação em sua plenitude, transformando-o em parcialmente anistiado.
Entretanto, a luta não parou com a aposentadoria e acabou por fundar a Associação dos Aposentados e Pensionistas de Bauru e Região, sendo que na sua gestão como presidente foi adquirida a sede própria para a entidade, tendo sido agraciado com o titulo de “Cidadão Bauruense”, por iniciativa do vereador José Carlos de Souza Pereira – Batata – do Partido dos Trabalhadores.
Continua aos noventa e um anos de idade, militando no Partido Comunista do Brasil, demonstrando uma trajetória de coerência política e ideológica, além de esbanjar vontade para viver o resto de seus dias em uma pátria verdadeiramente livre.

ARMANDO FERREIRA DOS SANTOS

Queira-te eu tanto, e de tal modo em suma, que não exista força humana algumaque esta paixão embriagadora dome.
E que eu por ti, se torturado for, possa feliz, indiferente à dor, morrer sorrindo a murmurar teu nome”
(Carlos Marighela, poesia “Liberdade”, São Paulo, Presídio Especial, 1939).

Em oito de Maio de 1945, as sirenes, sinos e apitos de todas as cidades livres do mundo anunciavam o término da guerra e a vitória das forças democráticas contra o nazi-fascismo. Quarenta milhões de pessoas haviam sacrificado suas vidas na luta pela liberdade.
O governo de Getulio Vargas, impulsionado por milhões de patriotas de todas as camadas sociais, enviara para os campos de batalha da Europa, nossa gloriosa Força Expedicionária Brasileira. Tínhamos contribuído com o nosso quinhão para a derrota da fera nazi-fascista.
Todavia, o pentágono norte americano, braço armado das multinacionais, então com o monopólio da bomba atômica, percebendo o sopro de democracia que varria o mundo, determinando profundas transformações econômicas, políticas e sociais, buscou amedrontar os povos lançando duas bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki no Japão, provocando a morte de quinhentas mil pessoas e posteriormente de outros milhares em conseqüência da radiotividade.
Estava bem claro: mal terminada a guerra surgia novo perigo de outra hecatombe contra as forças da Paz, da Democracia e do Progresso. Por todos os quadrantes da terra surgiram protestos, aguçando-se a luta pela paz e reivindicações de toda a humanidade e liderando estes movimentos surgiam os melhores filhos do povo brasileiro. Trabalhadores do campo e da cidade, intelectuais, técnicos, cientistas, médicos e militares.
Na então Companhia Paulista de Estrada de Ferro surgia à figura altaneira do escriturário Armando Ferreira dos Santos. Nascido em Campinas, no dia 27/09/1913, veio a falecer em 11/02/1978, na cidade de Jundiaí. Era filho do chefe de estação da Paulista, Sr. Vicente Ferreira dos Santos e de dona Sebastiana Gonçalves dos Santos.
Jovem, antifascista, impregnado de profundo sentimento humano, não havia movimento reivindicatório ou político em que não estivesse envolvido, participando de forma ativa.
A greve por aumento de CR$ 500,00 (quinhentos cruzeiros) nos salários, que eclodiu em Bauru, aos 20 de janeiro de 1949, teve nele um dos coordenadores. Foram suas as orientações para que os ferroviários enfrentassem a reação cantando o hino nacional e com uma enorme bandeira nacional, tremulando sobre as cabeças. Nas reuniões preparatórias para o movimento, explicava aos companheiros:

“Não somos bandoleiros, respeitamos o patrimônio da ferrovia, estamos subnutridos. Temos o direito de levar um pouco mais de pão para nossos lares. Por ser considerado crime, vamos ser massacrados. Nosso auriverde pendão será nossa arma e o Hino Nacional as balas com que nos defenderemos”.

Realmente, os ferroviários da Paulista foram atacados covardemente com bombas de gás lacrimogêneo, coices e tiros de fuzis e metralhadoras.
Defenderam-se com o Pavilhão e o Hino Nacional.
São suas as palavras inseridas no boletim distribuído aos ferroviários, dois dias após o movimento:

“Estamos dispostos a defender nosso direito de não morrer de fome, por todos os meios de luta ao nosso alcance. Glória aos heróis de Triagem! Avante para a luta, pelo aumento geral dos salários!”.

Simultaneamente a eclosão do movimento paredista em Triagem, contatou as lideranças ferroviárias da Noroeste do Brasil, que liderados pelos históricos defensores dos trabalhadores, Antenor Dias e Júlio Xavier, declararam-se em greve de advertência e solidariedade aos seus companheiros da Paulista e naquele mesmo ano, no dia 7 de setembro, em pleno desfile comemorativo da Independência na Avenida Rodrigues Alves, Armando participava, juntamente com dezenas de outros companheiros, empunhando faixas de protestos, onde se liam:

“Não queremos uma nova guerra e sim a paz!”.
“Queremos independência política, econômica e social!”.
“Abaixo os trustes americanos!".

Conseguiram percorrer metade da avenida, até que a repressão policial se fizesse sentir. Debandaram e foram fazer um comício relâmpago contra a guerra e a construção de bombas atômicas, na saída da “matinê” do então Cine Bauru. Foram espancados, presos e condenados a três meses de cadeia.
Era crime lutar pela Paz e contra a bomba atômica!
Cumprida a pena, Armando deu seqüência as suas lutas e foi organizar os ferroviários da Estrada de Ferro Central do Brasil, nas oficinas da Estação Presidente Roosevelt em São Paulo. Com seu poder de persuasão e firmeza ideológica, liderou uma greve parcial e de advertência por melhores salários.
Nos anais das Câmaras Municipais de Campinas e de Jundiaí, estão arquivados centenas de projetos, de benefício público, apresentados e defendidos pelo vereador Armando Ferreira dos Santos. Foi um dos vereadores mais combativos que por aqueles legislativos passou, tendo o reconhecimento popular, pois constantemente era um dos mais votados. Era a manifestação popular, era a gratidão demonstrada a um dos mais ilustres filhos de nosso povo.
Quando de sua morte, em 1978, o seu velho companheiro de lutas Elias Calixto Bittar, escreveu a seguinte carta em sua homenagem:

A MORTE DO IDEALISTA

Dia desses, com lágrimas nos olhos, acompanhei os funerais de um velho amigo, Armando Ferreira dos Santos, o maior idealista que conheci em minha vida.
Passou sua existência lutando por tudo aquilo em que acreditou. Como todo homem sensato, foi sempre autêntico. Caminhou sempre em uma determinada direção de vida, movido por seus ideais. Entendia sempre que o povo brasileiro somente poderia ser feliz, se por aqui fosse implantado o regime socialista de governo.
Pagou na própria carne, o preço alto demais, em virtude daqueles que habitualmente contestava, serem mais poderosos. Mais tarde descobriu que essa não era a melhor forma com que poderia ajudar a atender aos superiores interesses de nosso país.
Simplesmente mudou de idéias. Começou tudo novamente, movido por outros ideais.
Foi amigo de seus amigos até o ponto máximo da palavra. Com eles nunca participou de nenhuma ação indigna. Dono de uma inteligência admirável e de discernimento a toda prova, era de um papo super saboroso, destes que a gente não cansa de ficar ouvindo horas e horas.
Como todo aquele que luta por um mundo melhor, na forma de ver as coisas, nunca se preocupou em ganhar dinheiro. Até pelo contrário, o pouco que tinha distribuiu entre seus semelhantes.
Foi vereador na cidade de Campinas. Extremamente atuante, deixou na velha terra das andorinhas, uma enorme soma de serviços prestados, que ajudaram a fazer daquela cidade, uma das mais importantes do interior.
Em Jundiaí foi candidato a vice-prefeito, quando as eleições eram desvinculadas e por muito pouco, não logrou vencer a eleição. Seus conhecimentos sobre política e a sua forma de ver o homem dentro de uma disputa eleitoral, serviram para dar a muitos políticos de nossa terra, uma posição de destaque em nossa sociedade.
Respeitabilíssimo por seus adversários pela lealdade com quem sempre lutou em favor de suas idéias, granjeou, mesmo entre grupos antagônicos, uma extraordinária soma de respeito e de admiração. A grande diferença entre o idealista e o oportunista é que, aquele que tem ideal, sacrifica-se a vida toda por ele e conseqüentemente morre pobre.
Pois bem, Armando Ferreira dos Santos, morreu pobre em termos de dinheiro, mas riquíssimo em moedas que o homem não pode aviltar, que são: a dignidade, a consciência de ter sido um excelente cidadão e, o que é mais importante, teve sempre o respeito de todos os patriotas.
Não importa a idéia que se possa ter, quando ela esta calcada na sinceridade. O que é mais importante, dizem os grandes pensadores, é ter o espírito aberto para a realidade e não ter medo de recuar, toda vez que se convence pela própria razão, pelo seu próprio discernimento, de que estas não são as melhores formas de servir seu povo e ter a coragem necessária para voltar atrás, e de estender suas mãos, para aqueles que tinham sido seus próprios algozes, fazendo isto, sem ódio e sem ressentimento.
Armando, em vida, sempre foi um sujeito preocupado em saber o que havia do lado de lá, ou seja, depois da vida.
Agora, ele já sabe e com certeza deve estar no céu. Nesta hora, deve estar fazendo sua rodinha, conversando com muitos anjos e contando suas histórias.
Igualmente, seu filho Luiz Carlos, escreveu a seguinte mensagem em homenagem ao seu pai.

AO MEU GRANDE AMIGO

Amigo, palavra que pude pronunciar.
Respeito e admiração tiveram demais.
Meu pai e amigão
Andávamos juntos pelo mesmo chão.
Nas horas amargas fazias refrão.
Da vida fizeste uma oração
Onde ouvi e aprendi esta lição.

Foste um bom pai
E estiveste presente em toda minha vida.
Rimos, choramos e brincamos juntos.
Rancor um do outro, nunca guardamos.
És, foste e continuarás sendo meu companheiro.
Inimitável, fabuloso, e acima de tudo amigo.
Recordações lindas e inesquecíveis...
Amar-te-ei, meu velho, para sempre.

Deste de ti, mais do que devias...
Ontem foste líder, hoje lembranças.
Sua imagem será para todos um símbolo.

Sacrificastes anos da tua vida
Apenas para ver um sonho teu crescer.
Nada te impedia de querer mais e mais para os outros.
Tanto que para ti, nada, ou quase nada deixaste.
Os políticos te seguem como modelo e por isso talvez,
Seu nome, ARMANDO FERREIRA DOS SANTOS, vire rua.

ELIAS CALIXTO BITTAR.

“Os filósofos alemães estão discutindo o mundo em termos metafísicos. Chega de discutir o mundo, vamos transformá-lo".
(A miséria da filosofia, Karl Marx)

Nascido em Campinas, interior de São Paulo, aos quatro de agosto de 1919, tendo sido radiotelegrafista da Companhia Paulista de Estrada de Ferro e um dos líderes do movimento paredista de Triagem, em 20/01/1949. Demitido do serviço e condenado a um ano de cadeia pela participação nesta greve, evadiu-se da cidade de Bauru, indo para a capital do estado, onde foi ser o responsável pela segurança do aparelho onde se reunia o Comitê Ferroviário do Partido Comunista Brasileiro, acabando por conviver no dia a dia, com figuras lendárias do Partido Comunista, afinal, Carlos Marighela, Luis Carlos Prestes, Joaquim Câmara Ferreira, mantinham constante contato com os militantes ferroviários, visto estes representarem o movimento sindical organizado em nosso país. Elias, ou Arnaldo, que era o codinome utilizado por este companheiro, militava no PCB desde antes de sua legalização nos anos quarenta, recrutado que havia sido por Ramiro Luchesi, outro histórico militante comunista, que construiu uma história de lutas no movimento da esquerda brasileira. Elias tem uma excelente memória e conta alguns fatos que vivenciou em sua militância política clandestina, com seus detalhes mínimos.
Recordava-se que a sede do Diretório Municipal do PCB, na cidade de Bauru, foi instalado em um imóvel de propriedade do Dr. Silvino Spindola, notório integralista, na Avenida Rodrigues Alves. Ria muito, quando se recordava que a placa com o nome do Partido e o símbolo da foice e do martelo, contrastavam com a pintura verde do prédio.
Outro fato marcante nesta militância de Arnaldo é o episódio da expulsão do militante Delamare Machado da Silva, dos quadros partidários, durante o período da legalidade. Diz, recordar-se até hoje do semblante calmo e tranqüilo de Delamare, quando tomou conhecimento da decisão do Diretório Municipal, e, ressalta que muito embora expulso, o velho Delamare jamais deixou de hipotecar solidariedade e participar ativamente das lutas da classe trabalhadora, conforme comprovamos em outras pesquisas sobre os comunistas. O artífice da expulsão deste militante foi José Duarte, outra verdadeira legenda do marxismo brasileiro.
Indubitavelmente, uma das maiores participações de Elias na frente de massas, foi a Greve de Triagem de 1949, dos ferroviários da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, greve esta fortemente reprimida pela polícia local, repressão esta comandada pelo Delegado de Polícia, Ítalo Ferrigno e pelo dirigente da ferrovia, Engº Jaime Cintra, e com muita sorte escapou ileso do confronto com a repressão, amargando para todo o sempre uma coronhada de fuzil que levou no peito, em um verdadeiro coice como o denominava.
Posteriormente, atuou sempre na clandestinidade e na organização de infra-estruturas de aparelhos utilizados para reuniões do Partidão, servindo inclusive de motorista para os dirigentes partidários e era tido, como elemento de confiança e de grande responsabilidade. Foi Elias que conduziu Carlos Marighela, a uma propriedade rural, na periferia de Bauru, quando o mesmo esteve reunido com os comunistas locais, discutindo sua saída do PCB, na segunda metade da década de 60 e a criação de uma nova organização revolucionária com a finalidade de combater a ditadura militar. Foi Elias quem criticou o fato de Marighela e Câmara Ferreira, ficarem na linha de frente dos combates, por entender que estes deveriam ficar na retaguarda, atuando como estrategistas.
Punido em 1949, mesmo beneficiado pela Lei de Anistia, até hoje não teve sua situação resolvida pelos governantes, completando 58 anos de perseguição política por lutar por melhores salários para sua categoria profissional, justamente em um país, onde a pena privativa de liberdade não pode exceder trinta anos, por mais hediondo que tenha sido o crime.
Elias Calixto Bittar, faleceu em 23 de Novembro de 2004, aos 85 anos de idade não perdendo jamais o espírito de luta, estando sempre presente nos movimentos populares organizados na cidade de Bauru, tendo sido homenageado na Câmara Municipal, por iniciativa do vereador Marcelo Borges de Paula, do PSDB, com seu honrado nome batizando uma via pública de nossa cidade.

A LUTA PELA TERRA EM BAURU E REGIÃO.

Invasão da Fazenda Jacutinga.

Podemos afirmar com absoluta segurança de que a luta pela reforma agrária, começou há muito tempo em nossa região, bem como a luta contra a exploração do trabalhador rural. Muito embora, tenhamos registro que remontam ao início da década de 60, com certeza esta luta é anterior. Se não tivemos movimentos no sentido de ser realizada a reforma agrária, o movimento contra a exploração da mão de obra rural, sempre foi ativo em nossa região; e na década de 30, o líder camponês Oswaldo Pacheco, trabalhador da Fazenda Val de Palmas, preso nos anos trinta, acabou por morrer dentro do Presídio Maria Zélia na cidade de São Paulo. E, como sempre ocorre quando das denúncias de exploração da classe trabalhadora, os líderes dos movimentos reivindicatórios, imediatamente são tachados de comunistas, “inimigos dos patrões e da paz social”, “agitador perigoso” etc...
Aqui, na vizinha Presidente Alves, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais foi logo após o golpe militar acusado de congregar “perigosos líderes comunistas” tais como: “Francisco Caetano, presidente da entidade, além de Luís Vieira, Sebastião dos Reis, dentre outros membros da diretoria”. O nosso velho conhecido, investigador de polícia Carlos Rossa Netto, useiro e vezeiro na artimanha de enviar informes falsos para São Paulo, relatando falsamente a atuação dos comunistas em nossa cidade e região, neste caso específico demonstra amargamente todo o seu preconceito contra a presença de homens simples, rudes e camponeses na direção da entidade sindical. Talvez quisesse, referido cidadão, inimigo declarado da classe trabalhadora, que os trabalhadores rurais continuassem sem décimo terceiro salário, férias, descanso semanal remunerado e outros direitos trabalhistas, que os patrões de forma insistente negavam-se a pagar. Ora, os infratores costumazes da legislação eram os patrões, homens insensíveis e cruéis, que agiam como se fossem os donos da verdade e da lei, não restando dúvidas de que os verdadeiros criminosos eram os grandes latifundiários, que deveriam ser processados e condenados com fundamento na famigerada Lei de Segurança Nacional e não, os líderes sindicais dos camponeses, que lutavam pela aplicação da legislação aprovada pelo governo federal. Os que desobedeciam aos preceitos legais eram os patrões, entretanto, como vemos no curso da história em nossa pátria, as leis que beneficiam a classe operária, para poder ser aplicada, sempre custou o sangue e a vida de muitos trabalhadores e, em nossa região não poderia ser diferente. A par das reivindicações por melhores condições de trabalho e conseqüentemente melhorias salariais, o sindicato apoiou ostensivamente no ano de 1962, a invasão da Fazenda Jacutinga, invasão esta coordenada pelo líder camponês e comunista Jofre Correa Netto, que apoiado pelo então jovem líder estudantil José Ivan Gibin de Matos, pelo professor Alzirio do Nascimento, com a retaguarda das lideranças sindicais de toda a região, com grande arregimentação de trabalhadores rurais, coordenada pela entidade de classe, com a montagem do acampamento nas terras da fazenda, mais especificamente nas proximidades da casa sede, sendo que para dificultar a ação costumeira das forças repressoras, eternamente a serviço da burguesia, providenciaram a abertura de “valetas” nas vias de acesso a propriedade rural e cortaram os fios telefônicos que serviam a propriedade.
Como diríamos nos dias atuais, o bicho pegou.
Ousaram os trabalhadores rurais, capitaneados por Jofre Correa Netto, invadir uma propriedade rural do poderoso J.J. Abdala, conhecido mau patrão, entretanto, representante legítimo da burguesia decadente nacional, e tal afronta jamais poderia ficar impune.
Os trabalhadores, como sempre desarmados, em busca da solução para os problemas rurais e da reforma agrária, mais uma vez acabaram vencidos pela repressão e as lideranças do movimento, acabaram presas, processadas e condenadas por infração a Lei de Segurança Nacional. As lideranças operárias que permaneceram em liberdade, lançaram campanha nacional pela libertação de Jofre Correa Netto, o único preso político de então a nível nacional, com a elaboração de cartazes, panfletos e manifestações de rua, denunciando a arbitrariedade. A condenação havia sido bem fundamentada pelo Juiz de Direito da Comarca de Pirajuí, Dr.Luis Francisco Giglio, que buscou de forma caprichosa não deixar brechas legais, para os recursos apresentados pela defesa do líder camponês. O Juiz, que se notabilizava pela aplicação severa de penas contra lideranças operárias, sabia de antemão, que as pressões populares ocorreriam em busca da liberdade, e buscava cercear as oportunidades de defesa, acabando por proferir uma sentença de teor nitidamente fascista, onde demonstrava de forma nítida e cristalina a sua verdadeira faceta antioperária, de nada adiantando os argumentos da defesa apresentada pelos jovens causídicos bauruenses Joaquim Mendonça Sobrinho e Análio Gilberto Smith, pois para o magistrado interessava única e exclusivamente a condenação.
Não me venham dizer que a sentença condenatória contra Jofre Correa Netto e José Ivan Gibin de Mattos, líderes da invasão da Fazenda Jacutinga, foi exarada no estrito sentimento da lei, pois se assim fosse, o saudoso doutor Antonio Macedo de Campos, juiz de Direito da Comarca de Bauru, no pós-golpe militar de 64, teria condenado todas as lideranças operárias e estudantis bauruenses que foram processadas por infração a tacanha lei 1802 – Lei de Segurança Nacional. A consciência democrática do Dr.Macedo não permitiu que as condenasse. A consciência nada democrática do então juiz de Pirajuí enviou Jofre para a cadeia e condenou José Ivan que tão-somente não foi parar na cadeia, pois se evadiu e ao obter a confirmação da sentença, evadiu-se do país, buscando no exílio político a liberdade que o democrata Luis Francisco Giglio, quis tolher.
A invasão da fazenda, a prisão dos líderes do movimento e a atuação conseqüente das lideranças dos trabalhadores rurais, além da solidariedade popular em torno da figura carismática de Jofre calaram fundo n’alma dos repressores e fascitóides de toda a nossa região. Como poderiam ter a ousadia, os sindicalistas, políticos marxistas oriundos da classe operária e até humildes trabalhadores rurais de levantar a voz e realizarem campanha pela libertação do arremedo de líder – nas palavras do repressor-poeta Rossa Netto – Jofre Correa Netto. Era muita audácia e ousadia deste “Zé povinho” querer ler jornais e manifestos onde ficavam claros os seus direitos trabalhistas. A classe dominante e seus defensores incrustados na repressão, não admitiam em hipótese alguma que qualquer trabalhador lesse e conseqüentemente se instruísse.
Logo nos primeiros dias de Abril de 1964, que ao contrário de Abril de 1974 em Portugal, foi triste e doloroso para o povo brasileiro, que da noite para o dia viu-se desprovido de suas lideranças, que na calada da noite, foram seqüestrados pela polícia, como de hábito agem os repressores e todos aqueles que tem algo a esconder e, em Presidente Alves não poderia ter sido diferente. O Sindicato foi invadido, os membros da diretoria presos e os materiais encontrados confiscados. Lá, tal qual em Bauru e em todo o Brasil, jornais, livros, publicações diversas, foram apreendidos pela polícia, como prova inconteste da atuação subversiva dos trabalhadores e suas lideranças. E neste período, voltava a tona o episódio da invasão da Fazenda Jacutinga, nos eternos relatórios de Rossa Netto, o fiel discípulo de Hitler, Mussolini e Silvio Marques Júnior.

“... nos anos que antecederam a revolução de 1964, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Presidente Alves, notabilizou-se por congregar em sua diretoria, elementos comunistas de alta periculosidade, como era o caso específico de Francisco Caetano, então presidente daquele sindicato e de Luis Vieira, secretário do mesmo sindicato, seguindo-se os demais membros da diretoria...”.

Este relatório datado de 1970 mostra que o Carlão continuava o mesmo irresponsável, sempre colocando “demais membros”, “não nominados” etc..., em seus relatos, como se a nossa região estivesse apinhada de comunistas. Comprovadamente, este “tira” era um grande falseador da verdade, para não dizer mentiroso.
Continuava o seu relatório:

“ ... o sindicato nesta época serviu de centro de operações para o líder camponês comunista Jofre Correa Netto, bem como foi por seus seguidores transformado em centro de apoio logístico para garantir com suprimentos o líder comunista e seu séqüito de esquerdistas nas atividades guerrilheiras por ele desenvolvidas. A Sebastião dos Reis, coube a tarefa de arregimentar os trabalhadores rurais, proporcionando a Jofre, os homens que necessitava para engrossar as fileiras da subversão, para invadir e tomar, como efetivamente invadiu e tomou, em estilo de comando a mão armada, a já mencionada Fazenda Jacutinga, transformando-a segundo palavras de Sebastião dos Reis na primeira expropriação de terras dos capitalistas. Com a finalidade de impressionar a massa de homens que o seguia, Jofre hasteou as bandeiras nacional e paulista, procurando dar uma idéia de que aquela seria uma ação com amparo legal...”.

Interessante neste relatório, que concede grande importância ao trabalho de arregimentação realizado por Sebastião dos Reis, para no final acusá-lo de “ inculto, incapaz, explorador, débil mental e amoral”, ficamos pensando após ler este documento, que se a liderança era qualificada pelos repressores como inculta e incapaz, como o rotula o desqualificado repressor, o que teria efetivamente ocorrido em nossa região, se as lideranças fossem “ capazes e cultas”. Com certeza, não teríamos, neste princípio de milênio, as lutas do Movimento Sem Terra, pois estaríamos vivendo em uma pátria liberta dos grilhões imperialistas. Concluindo o seu relatório, o investigador do DOPS/Bauru, sugeria e solicitava aos seus superiores o fechamento da entidade sindical, pois ia contra os interesses dos proprietários rurais da região.
Portanto, o episódio da invasão da Fazenda Jacutinga, no início dos anos 60, representa o início efetivo da luta pela reforma agrária na região centro-oeste do Estado de São Paulo, e tal qual nos dias atuais, as suas lideranças foram perseguidas, difamadas e presas com base na legislação em vigor, sempre usada pelos detentores do poder para defender os proprietários dos latifúndios improdutivos.
Esperamos que um dia, consigamos levantar toda a história desta já lendária invasão, buscamos aqui resgatar as figuras de Jofre Correia Netto (membro das Ligas Camponesas de Francisco Julião), José Ivan Gibin de Mattos, Francisco Caetano, Luis Vieira e Sebastião dos Reis como os precursores da luta pela Reforma Agrária e o pagamento honesto, justo e correto aos trabalhadores rurais em nossa região.
Da mesma forma que no episódio da greve de Triagen, não conseguimos levantar os dados de todos os envolvidos neste episódio e contamos com a sua ajuda, amigo leitor, para completarmos o levantamento histórico.

ANÁLIO GILBERTO SMITH

"O louco que reconhece a sua loucura possui algo de prudente; porém, o louco que se presume sábio, esse está realmente louco".
Buda

Enquanto acadêmico de direito, da Instituição Toledo de Ensino na cidade de Bauru, Análio participou ativamente da vida estudantil, tanto dentro do Centro Acadêmico 9 de Julho, como na Associação Atlética da faculdade. Tinha como companheiro da militância do movimento estudantil JOAQUIM MENDONÇA SOBRINHO. Após intensa atividade na política estudantil, formaram-se e iniciaram a exercer juntos a advocacia, adentrando aos quadros do Partido Socialista Brasileiro e participando diuturnamente da vida política bauruense. Juntamente com Joaquim, foi advogado de defesa do líder camponês Jofre Correa Netto e do líder estudantil bauruense José Ivan Gibin de Mattos, no episódio da invasão da fazenda Jacutinga, na cidade de Presidente Alves. Era advogado de diversas entidades sindicais dos trabalhadores na cidade de Bauru e região, sempre pautando suas atividades na advocacia, na defesa dos direitos da classe trabalhadora. Além disto, na condição de Presidente do Partido Socialista Brasileiro, na cidade de Bauru, teve papel de importância no lançamento da candidatura do saudoso Edison Bastos Gasparini, como vice-prefeito da cidade, visto que nesta época o prefeito e vice eram eleitos separadamente. Quando do golpe militar de 1º de Abril de 1964, foram implacavelmente perseguidos pelos órgãos de repressão e pela FAC – Frente Anti-Comunista -, e enquanto Joaquim lograva empreender fuga para São Paulo, Análio buscou guarida justamente na casa do Sr. Adelino Mendonça, pai de Joaquim, na cidade de Arealva. Como a polícia estava vasculhando a região no encalço de ambos, acharam como de melhor valia sair da cidade, mesmo porque, para fugir de um cerco da polícia, viu-se obrigado a pular muros de residências no centro da cidade de Arealva, acabando por se ferir gravemente no tendão do pulso direito. Desta forma, à noite, Análio adentrou ao porta-malas do carro do Sr. Adelino, que o transportou até a cidade de Jaú, de onde o foragido seguiu para São Paulo. Mesmo anos depois do Golpe Militar, costumeiramente era demitido dos empregos, com fundamento em sua ficha policial, onde constava ter sido processado pela Lei de Segurança Nacional. Análio hoje reside na capital do estado, onde exerce a advocacia e é empresário do ramo imobiliário, sendo que poucas vezes retornou a Bauru, depois do golpe militar de 1º de Abril de 1964, tendo aqui comparecido em 12 de julho de 2003, quando nas dependências da Câmara Municipal, foi homenageado pelos atuais dirigentes do Partido Socialista Brasileiro, pelo seu passado de lutas em defesa da Liberdade e do Socialismo.

FRANCISCO CAETANO.

“Onde a força de vontade é grande, as dificuldades não podem sê-lo.”
Nicolau Maquiavel.

Nascido em Reginopólis, Estado de São Paulo, aos 16/08/1927, filho de Servino Caetano e de dona Lazara Antonia Silveira de Jesus, era presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Presidente Alves, anteriormente ao golpe militar de 1964, tendo colaborado de forma decisiva e eficiente na arregimentação de trabalhadores rurais, para a invasão da Fazenda Jacutinga, de J.J. Abdalla, organizada e perpetrada pelo líder camponês Jofre Correa Netto, com a colaboração de José Ivan Gibin de Mattos. Esta participação rendeu-lhe perseguição por parte da polícia política durante muito tempo, que o mantinha sob vigilância durante todo o tempo. Preso com o golpe militar de Abril de 1964 foi processado pela Lei de Segurança Nacional e absolvido por falta de provas, continuando a atuar no Sindicato, na defesa intransigente dos interesses da classe trabalhadora, acabando por ser preso novamente em princípios de novembro de 1970 e levado para o Quartel do Exército de Lins. O investigador de polícia Carlos Rossa Netto, do DOPS/Bauru, mostrava o seu inconformismo, ao escrever em seus relatórios que Francisco Caetano, era um trabalhador rural atrevido, que dizia ler clássicos da literatura marxista, além de revistas e jornais, sendo estes costumes inconcebíveis para um trabalhador. É outra história que necessita ser melhor resgatada pelos estudiosos e interessados nos heróis anônimos da classe trabalhadora.

JOAQUIM MENDONÇA SOBRINHO

“Precisamos de muito pouca coisa: apenas uns dos outros"
(Carlito Maia).

Nascido em Arealva-Sp., aos 14.06.1937,advogado e comerciante, foi ao lado de José Ivan Gibin de Mattos, Análio Gilberto Smith, Saad Zogheib Sobrinho, dentre tantos outros, uma das vítimas preferenciais da saga anticomunista de Silvio Marques Júnior, que via nas atividades de Joaquim como advogado de vários Sindicatos dos Trabalhadores na cidade de Bauru, a prática ideal visando a subversão da ordem e de disseminação dos ideários marxistas. Ademais, Joaquim fundara em Bauru, o Diretório Municipal do Partido Socialista Brasileiro, que era o hospedeiro natural dos militantes do então proscrito Partido Comunista. Vinha de uma excelente militância no Movimento Estudantil, onde tinha sido presidente do Centro Acadêmico IX de Julho e tinha tido participação ativa em momentos importantes da política, pois juntamente com seus companheiros, não conseguia permanecer omisso ante a realidade nacional.
Organizou protesto contra a invasão da “Bahia dos Porcos” em Cuba, na tentativa americana de derrubar Fidel Castro e desta forma, acabar com a revolução cubana. Foi, igualmente um dos organizadores da denominada “Semana das Reformas Políticas”, realizada em nossa cidade por entidades estudantis e sindicais, trazendo para encerrar a referida semana, o Deputado Federal Almino Afonso, então denominado de “Patativa do Congresso Nacional”, pela eloqüência de seus discursos.
Na Presidência do CA IX de Julho, lutou para conseguir concretizar um velho sonho da comunidade acadêmica, a construção da Casa do Estudante, em terrenos doados pelo Comendador Daniel Pacífico.
Conseguiu evadir-se quando da eclosão do Golpe Militar de 1º de Abril de 1964, fato este que ocasionou alvoroço nas fileiras da Frente Anti Comunista e da Polícia Bauruense. Colocaram a Força Pública, comandada pelo então Tenente Ventrice, com apoio de legionários da FAC e dezenas de soldados com cães amestrados em seu encalço.
Dirigiram-se até a propriedade rural do pai de Joaquim, Sr. Adelino Mendonça, na cidade de Arealva, em busca do perigoso comunista e de seu companheiro Análio Gilberto Smith. Deram tiros, dispararam rajadas de metralhadoras, de forma infrutífera, ocasião em que acabaram por prender sua irmã, colocando-a atrás das grades da Cadeia Pública de Arealva, na esperança vã de que esta ficasse desesperada e informasse o paradeiro do irmão. Não contavam com a popularidade de Adelina, a Nina, na pequena Arealva. Assim que correu pela cidade a notícia de que a estimada professora encontrava-se encarcerada, uma verdadeira multidão postou-se nas proximidades da Delegacia de Polícia, querendo saber os motivos de tão despropositada atitude das chamadas autoridades policiais.
Enquanto isso, Joaquim encontrava-se escondido no apartamento de um amigo na cidade de São Paulo,
Entretanto, a bem sucedida fuga de Joaquim serviu para atiçar ainda mais a ira da repressão política, que, a cada oportunidade que surgia, enviavam relatórios para São Paulo, dando conta de suas atividades políticas e dos encontros, mesmo que ocasionais, com militantes comunistas. Assim o foi em 1965, quando foi novamente fichado juntamente com diversos militantes da classe trabalhadora e o Juiz de Direito Dr. Francisco Antonio Gomes Neto. Igualmente nas denúncias, muitas vezes inverídicas e mentirosas de Silvio Marques Júnior, invariavelmente surgia o nome de Joaquim. Em 24.06.1969, foi denunciado, para a Quarta Zona Aérea da Aeronáutica, de que estaria viajando com constância para o Uruguai, onde estaria mantendo contatos com João Goulart e Leonel Brizola. O denunciante era pessoa que devia inúmeros favores pessoais para Joaquim e nesta época entendia que complicando a vida do amigo, junto aos órgãos repressivos, estaria livre inclusive de dívidas que possuía para com este. Pessoa relativamente conhecida da cidade e já falecida, em respeito aos seus netos, genros e filhas, não divulgaremos o seu nome.
Posteriormente em 24 de Março de 1970, compareceu ao DOPS/Bauru, acompanhado do dr. Orlando Landgraff e de Antonio Moreira, para prestar esclarecimentos sobre os livros que ocultara por ocasião do Golpe Militar. Na informação, enviada para São Paulo, o então delegado do DOPS/Bauru, comunica que mantém os três elementos sob observação e relaciona os livros apreendidos. A vigilância sobre Joaquim continua por longo tempo, imiscuem-se em seus negócios particulares, chamam os seus sócios em uma fazenda no Paraguai de contrabandistas, oportunistas, de possuírem amantes espanholas, que na realidade eram comunistas perigosas, etc...
No pós-golpe, Joaquim mostrou a sua coerência e sua solidariedade ao defender militantes políticos bauruenses processados por infração a Lei de Segurança Nacional. Afastou-se posteriormente da militância política, continua advogando e exercendo atividades comerciais, entretanto antes do golpe militar de 1º de Abril de 1964, foi um militante do então proscrito Partido Comunista que não fugia da luta e que estava sempre presente nos movimentos operários da cidade. Os investigadores e delegados do DOPS de Bauru, demonstravam ter grande antipatia por sua pessoa, haja vista as terminologias utilizadas para descrever suas atividades, mas hoje, com certeza, Joaquim dá boas risadas ao ler o que a polícia escrevia para relatar suas atividades na cidade de Bauru.
JOAQUIM MENDONÇA SOBRINHO pelo seu espírito de luta e de solidariedade humana, que prática até os dias atuais, merece ser sempre lembrado como coerente militante político da esquerda.